Eu não percebo o espanto das pessoas quando sabem que sou educadora e não pus o meu filho na escola. O meu filho tinha apenas quatro meses quando voltei ao trabalho. Surgiu uma boa oportunidade de emprego e para isso abdiquei das horas de amamentação. Chorei muito, mas tinha contas para pagar, tal como todas as mães que inscrevem os bebés nos colégios.
Ainda eu estava grávida quando a minha avó se ofereceu para ficar com o Gustavo quando eu voltasse a trabalhar. Nem pensei duas vezes, apenas por questões financeiras.
Na altura trabalhava com miúdos dos três aos seis anos, nunca tinha estado num colégio com crianças mais pequeninas. E nunca tinha tido um filho.
Só quando ele nasceu eu tive noção de quanto um bebé precisa da mãe. E não tendo a mãe, do quanto um bebé precisa de mimo, colo, amor e muita paciência. Sim precisam. A ideia de que excesso de mimo estraga um bebé está a ficar desatualizada graças a Deus.
Vamos imaginar um minuto, ou tentar, o que é para um bebé vir ao mundo. Está habituada ao quentinho, à voz da mãe, a não sentir fome, nem frio, nem calor, a estar constantemente a ser embalado num mar que lhe é familiar onde se sente em casa. De um momento para o outro está num local que nunca conheceu, vê mil caras diferentes, barulhos, luzes, cheiros, experimenta um sem número de sensações em seu redor que nem sempre são boas.
De início quase sentia vergonha de dizer que não ia por o meu filho na escola. Até que a pediatra do Gustavo me respondeu "Até aos dois anos os infantários são infétários. Deixe o rapaz em casa". No centro de saúde a médica de família foi da mesma opinião.
Entretanto fui trabalhar para um local onde existia berçário e creche. E ali eu vi a realidade do que é ter um bebé numa escola. Aquelas colegas davam tudo delas. Mas são humanas. Nenhum humano se desdobra em vários humanos. Um berçário tem em média 8 bebés e duas pessoas para tomarem conta deles.
Cheguei a ver a educadora sentada com três bebés no colo para que nenhum chorasse. Eu acredito que muitas vezes até choravam só porque sim, sei lá. Ou porque queriam a mãe. Mas a mim recém mamã ansiosa, mexia-me mesmo com os nervos.
Cada vez que tinha de passar pelo corredor do berçário sentia-me tonta. Aquele choro de bebé mesmo pequenino, muito estridente e sentido. Eu só conseguia pensar, "E se fosse o meu bebé?". E eles choravam, muito. Como é normal. Eles choravam, mas as responsáveis não conseguiam chegar a todos ao mesmo tempo. Havia fraldas para mudar. Havia leite para dar. Mas elas tentavam de tudo. E carinho e brincadeiras não faltava aqueles miúdos.
Certo dia uma colega comentou algo parecido com "Não se consegue. Eu não consigo chegar a todos. A Maria adormeceu de cansaço de tanto chorar." E eu vi o desespero e o coração apertado dessa colega por não conseguir fazer mais. A Maria chorava muito. Mas a Joana, o Manuel, a Carolina e o Afonso também. Elas não conseguem chegar a todos e nesse dia foi a Maria que ficou de parte. Foi um dia atípico. Faltaram duas colegas ao trabalho. As educadoras e assistentes também adoecem. Os bebés adaptam-se, e com o tempo acredito que aprendem a sentir-se seguros e a dormir descansados sem o colinho da educadora.
Sei que hoje em dia ainda há mães e até profissionais da saúde e da educação que defendem que um bebé deve chorar até se cansar. Eu não. Eu só consigo pensar, se a Maria fosse o meu Gustavo.
Não quero com isto deixar mães inseguras ou ansiosas. Até porque as contas são fáceis de fazer: não existem adultos suficientes na maioria dos colégios para chegarem da forma que deviam a todas as crianças. Mas isso não significa de todo que os bebés estão para ali a berrar de manhã à noite, porque não estão mesmo. Claro que há bebés mais inseguros que outros. Tranquilizem-se em saber que quem cuida dos vossos filhos, fica de coração partido por não conseguir chegar a todos. E que perdem muitas horas de almoço para dar colinho. E que saem muitas vezes mais tarde para dar uma ajuda a mudar as fraldas. E que cantam todas as canções de que se lembrarem para os animar, mesmo que tenham uma péssima voz. E se eu vi e ouvi muitos bebés chorarem, também vi e ouvi muitos darem gargalhadas. E vi bebés a não quererem ir com a mãe quando esta os ia buscar. Eles eram, na maioria do tempo, felizes ali.
Mas aquelas vezes em que ouvia aqueles choros arrepiantes, foram o suficiente para eu querer o meu filho com a minha família em casa e não num colégio. (Gostava mesmo que todas as mães tivessem essa hipótese). Serei egoísta? Serei galinha? Serei paranóica? Estarei a criar um puto mimado? Que se lixe.
Continuo a ter a opinião pessoal e profissional de que um bebé só deve ir para um colégio antes de completar um ano se os pais não tiverem outra opção. E sim, há mães desempregadas que põem os filhos no colégio com quatro meses.
Lamento que em Portugal se valorize tão pouco uma recém mamã e um recém bebé. Infelizmente a maioria das mães não tem grandes opções pois o dinheiro faz falta. Por outro lado, muitas mães não têm família que possa ficar com o rebento. Eu neste caso tenho, mas se tivesse um segundo filho já não tinha. E aí teria de colocar o bebé num colégio bem cedo. Mas acredito que ele ia ficar bem, por muito que me doesse. E vocês também devem acreditar, se for o caso.
Para já, o Gustavo tem 19 meses e vai continuar a ficar em casa com a família.
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Meu anjo. 1 mês. |
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Miminhos da mãe. 1 mês. |
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Miminhos do pai. 1 mês. |